JOTA
12/06/2016
A aplicação de regras da Organização Mundial do Comércio (OMC) no ordenamento jurídico brasileiro não é consenso entre especialistas. Uma possível saída para tratar a questão com coerência e harmonizar o entendimento entre juízes seria a criação ou especialização de varas federais.
Esta é uma das constatações do debate Comércio Exterior e Poder Judiciário, que fez parte do 16º Seminário IBRAC sobre Comércio Internacional, realizado pelo Instituto Brasileiro de Estudos de Concorrência, Consumo e Comércio Internacional. Nesta mesa, mediada pelo advogado Rabih Nasser, do escritório Nasser Sociedade de Advogados, advogados especialistas em Direito Internacional e outros profissionais abordaram o tema.
A grande questão para os palestrantes presentes foi: regras de uma organização internacional podem valer mais que a legislação nacional?
“Não há regras claras no Judiciário brasileiro entre direito nacional e internacional. Boa parte da discussão fica na teoria das escolas de Direito, e isso leva a falta de clareza de como esses temas são tratados pelos magistrados”, afirmou Daniela Arruda Benjamin, diretora da Coordenação-Geral de Contenciosos do Ministério das Relações Exteriores.
Ela defende a presença das regras da OMC no Judiciário brasileiro.
“Regras da OMC foram negociadas para terem vigências entre países, mas no Brasil há lacunas constitucionais sobre a interação entre direito nacional e internacional”, assinalou.
Da mesa, o mais crítico em relação à regularização das regras da OMC no Brasil foi o juiz federal Marcelo Freiberger Zandavali, da 2ª Vara de Bauru.
Para embasar sua opinião, ele abordou a situação em outras regiões do mundo.
“Nos EUA, nenhuma parte privada tem preferência em relação a comércio exterior. Na União Europeia e no Japão também. Temos algumas súmulas que tratam a questão, mas quem está certo? Nós ou o mundo todo?”, questionou.
Para o juiz, não é certo o Brasil dar prioridade às regras internacionais da OMC se o mesmo não será feito com o país no exterior.
“Súmulas existentes devem ser revistas imediatamente”, defendeu.
Ele se referia a súmulas, não explicitadas, em que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) se posicionou favorável ao ordenamento da OMC.
A mesa também debateu a diversidade de decisões no país a respeito do tema.
“Isso acontece devido à complexidade das regras do comércio exterior, o que leva o Judiciário a ter dificuldade em criar demandas”, explicou a advogada Cynthia Kramer, do LOB-SVMFA Advogados.
Varas especializadas
Para os especialistas, o que pode vir ajudar a solucionar a questão seria a especialização ou criação de varas federais especializadas no comércio internacional.
“Um juiz não especializado analisar um tema desse teor demanda muito tempo de estudo e conhecimento específico. A especialização é estremamente necessária”, pontuou o juiz federal de Bauru.
Para a advogada Cynthia Kramer, os magistrados que se dedicassem a cuidar única e exclusivamente do tema acelerariam em 40% o tempo de julgamento de ações referentes.
“Mas é preciso, também, juízes capacitados para re-avaliar os casos em segunda instância quando houver recurso. Caso contrário, as varas tem pouca efetividade”, pondera a advogada.
Aluísio de Lima Campos, presidente da ABCI e professor da American University, diz que há uma inconsistência no ordenamento jurídico brasileiro para tratar o tema. As varas, para ele, resolveriam o tema.
“Nós sabemos que regularizar a legislação é muito díficil, pois há um processo de convencimento legislativo muito demorado”, disse.
Daniela Arruda se posiciona favorável à criação das varas especializadas, mas aponta obstáculos no caminho.
“Pelas decisões de diversos tipos já existentes, isso poderia suscitar dificuldades para os juízes no início”, argumentou.
Disponível em: http://jota.uol.com.br/regularizacao-de-regras-da-omc-no-judiciario-brasileiro-nao-e-consenso-entre-especialistas