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Aberta Consulta Pública sobre acesso a medicamentos por meio de programas assistenciais

Aberta Consulta Pública sobre acesso a medicamentos por meio de programas assistenciais

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (“Anvisa”) publicou no Diário Oficial da União (“DOU”), em 27.10.2023, a Consulta Pública n° 1.210, de 26 de outubro de 2023 (“CP n° 1.210/2023”), a fim de receber contribuições da sociedade acerca da proposta de revisão do regulamento dos programas assistenciais, com possibilidade de participação de todos os interessados no período de 03.11.2023 a 02.01.2024.

A presente CP, se convolada em Resolução, substituirá a Resolução da Diretoria Colegiada – RDC n° 38, de 12 de agosto de 2013 (“RDC n° 38/2013) e suas alterações, colocando em aplicação um novo texto que englobará a incorporação de ferramentas que facilitem a condução dos programas ditos assistenciais, tais como a análise baseada em risco, a utilização de notificação nos casos de menor risco, entre outras ferramentas.

Em linhas gerais, a RDC n° 38/2013 trata de três programas assistenciais, conforme listado a seguir:

  1. PROGRAMA DE ACESSO EXPANDIDO (“AE”) – programa em que um grupo de pacientes pode ter acesso a medicamento novo, promissor, sem registro na Anvisa ou não disponível comercialmente no país, desde que tal medicamento esteja com estudo de fase III em desenvolvimento ou concluído e que se trate de grupo de pacientes portadores de doenças debilitantes graves e/ou que ameacem a vida, em casos em que não haja alternativas terapêuticas satisfatórias com os produtos registrados;
  2. PROGRAMA DE USO COMPASSIVO (“UC”) – programa em que um paciente pode ter acesso a medicamento novo, promissor, sem registro na Anvisa, que esteja em processo de desenvolvimento clínico, independentemente da fase, mas com dados promissores, desde que seja destinado aos pacientes portadores de doenças debilitantes graves e/ou que ameacem a vida e sem alternativa terapêutica satisfatória com produtos registrados no país.
  3. PROGRAMA DE FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO PÓS-ESTUDO (“FMPE”) – programa em que o paciente participante de determinado estudo clínico tenha acesso gratuito ao medicamento sujeito a pesquisa, aplicável no caso de encerramento do estudo ou quando finalizada a sua participação na pesquisa clínica, com garantia de fornecimento enquanto houve benefício ao paciente, sempre a critério médico.

A Anvisa disponibilizou, em seu site, informações indicando que entre 2019 e 2023 foram recebidos 41 pedidos de autorização para o acesso expandido, 58 pedidos de autorização para o uso compassivo e 256 pedidos relativos ao fornecimento de medicamento pós-estudo (acesse aqui). Atualmente, de acordo com os termos da RDC n° 38/2013, a Anvisa deve conceder anuência prévia para que os programas assistenciais sejam implementados. Considerando o volume de trabalho da Agência, é possível que a referida anuência prévia obrigatória não ocorra dentro da brevidade necessária.

Por este motivo, a CP n° 1.210/2023 busca promover melhorias no regramento atrelado a esses programas assistenciais, inclusive para gerar celeridade nas análises da Anvisa, bem como para dispensar tais análises nos casos em que especifica, conforme explicação da Diretora e Relatora da CP, Meiruze Sousa Freitas, como pode se verificar no teor do seu  voto de aprovação (acesse aqui).

A proposta em CP sugere, por exemplo, que certos pedidos relativos aos programas assistenciais considerem a análise baseada em riscos, podendo haver dispensa de tal análise em casos enquadrados como de menor risco, que irão demandar apenas notificação à Anvisa, enquanto os casos de maior risco seguirão normalmente a via de aguardar a prévia anuência da Agência.

Além dos três programas de acesso previstos na RDC n° 38/2013, a CP cria uma nova modalidade de programa:  Programa de Acesso por Paciente Indicado (“API”), em que há possibilidade de acesso gratuito a medicamento novo ou inovador, registrado na Anvisa e/ou por autoridade regulatória membro do ICH na indicação terapêutica de interesse, e que não esteja disponível no país, direcionado ao uso individual de paciente acometido por doença debilitante grave e/ou que ameace a vida, desde que não existam alternativas terapêuticas satisfatórias disponíveis no Brasil.

Em termos práticos, quando o medicamento não estiver registrado no Brasil e nem no exterior (por autoridade regulatória membro do ICH), o paciente poderá tentar ter acesso ao medicamento por meio do programa de uso compassivo, que demanda anuência prévia da Anvisa. Já, nos casos em que há registro na Anvisa e/ou em alguma outra autoridade regulatória membro do ICH, o paciente pode acessar o medicamento por meio do acesso por paciente indicado, que demanda notificação da Anvisa, sem a necessidade de anuência prévia, sendo certo que a responsabilidade sobre a condução do programa, o acompanhamento dos pacientes, a notificação de eventos adversos, bem como a apresentação de relatórios serão compartilhadas entre o patrocinador e o médico responsável.

Convém mencionar que, diferentemente do acesso expandido, que é direcionado a um grupo de pacientes, o uso compassivo e o acesso por paciente indicado são direcionados a um paciente específico, tendo caráter pessoal e intransferível.

Além disso, a Consulta Pública visa definir que o fornecimento de medicamento pós-estudo consistirá na disponibilização de medicamento aos participantes ao final do estudo clínico, por parte do patrocinador, e no intervalo entre o término da participação individual e o final do estudo, indicando que o programa seguirá os critérios definidos nas resoluções e normativas da instância nacional de ética em pesquisa clínica, não mais demandando anuência prévia da Anvisa, mas sim notificação.

No tocante à importação de medicamentos no contexto dos programas assistenciais, a CP define que, após o embarque no exterior, o patrocinador ou o a Organização Representativa do Patrocinador (“ORP”) deve apresentar cópia do respectivo documento autorizador emitido pela Anvisa, em conformidade com as regras aplicadas a cada um dos programas assistenciais.

Ademais, a solicitação do Licenciamento de Importação (“LI”) deve ser realizada no próprio portal da Anvisa, por meio de formulário específico, podendo ser paralela à submissão do processo de anuência ou notificação dos programas assistenciais, com a indicação do quantitativo exato do medicamento a ser importado e, se houver qualquer alteração, uma nova solicitação de LI contemplando os dados corretos deverá ser solicitada.

Importante destacar que a CP determina que cabe ao patrocinador ou a ORP notificar a Anvisa de eventos adversos suspeitos, inesperados e graves, em até quinze dias do conhecimento do fato, salvo casos de óbito em que a notificação deve ocorrer em até sete dias. Além disso, é necessário providenciar o respectivo relatório final em até noventa dias após o encerramento do programa. A eventual descontinuidade do programa, antes do período previsto, exige que o médico assistente e/ou médico responsável apresente uma justificativa dentro do prazo de sessenta dias.

A CP dispõe, ainda, que a Anvisa pode solicitar informações adicionais a qualquer tempo aos responsáveis, bem como realizar inspeções para verificação de conformidade, sendo importante destacar que a inobservância aos dispositivos da nova Resolução, se aprovada, poderá constituir infração sanitária nos termos da Lei nº 6.437, de 20 de agosto de 1977, sem prejuízo das responsabilidades civil, administrativa e penal cabíveis.

Por fim, se a CP for aprovada nos dizeres atuais, quando convolada em RDC entrará em vigor na data de sua publicação no Diário Oficial da União, revogando a RDC n° 38/2013, conforme acima mencionado.

Autoria de: Marcos Silva Santiago

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