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Relatório sobre economia digital é lançado em reunião dos BRICS

Relatório sobre economia digital é lançado em reunião dos BRICS

No ano de 2017, durante a V BRICS Competition Conference, em Brasília, foi criado o BRICS Competition Authorities Working Group on Digital Economy. Trata-se de grupo de trabalho, composto por técnicos das autoridades de defesa da concorrência, que objetiva a cooperação entre os países do BRICS (Brasil, Rússia, Índia e China) para defesa da concorrência, com enfoque nos mercados digitais. Tal cooperação se mostra relevante devido ao caráter sem fronteiras desses mercados, bem como das novas questões trazidas pela tecnologia e novos arranjos relacionais.

O ponto de partida do trabalho foi um questionário para destacar as principais práticas e desafios enfrentados pelas autoridades antitruste. Não se pretendeu alcançar um plano homogêneo de ações no enforcement da defesa concorrência entre os BRICS, mas sim estabelecer uma base sólida para a cooperação, a partir das diferentes perspectivas e experiências de cada país na economia digital. O primeiro resultado de referido grupo se deu em setembro deste ano, quando foi lançado o relatório preparado pelo grupo.

Neste relatório, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) salientou sua preocupação com o dinamismo dos mercados digitais como uma das principais dificuldades. Sustentou que, em tais mercados, ao mesmo tempo em que a intervenção é necessária para proteger a concorrência e os consumidores, deve-se ter o cuidado em não frear inovações ou criar, acidentalmente, efeitos excludentes. Ademais, há outra evidente preocupação em relação aos efeitos a longo prazo das ações do Direito Concorrencial nos mercados digitais, especialmente nos de alta tecnologia, onde a inovação é marcadamente ainda mais dinâmica. Exemplo dado pelo relatório, é prever se uma empresa continuará a receber incentivos para inovar depois da aprovação de uma fusão ou aquisição.

Segundo o relatório, a competição dinâmica se associa com a ideia de que mercados que funcionam bem e são competitivos resultam em inovações de produtos e processos produtivos. É neste contexto que as autoridades visam garantir que os canais das inovações estejam abertos. Ademais, na medida em que negócios e tecnologias evoluem, há um debate contínuo sobre como tal competição dinâmica deve ser incorporada na análise concorrencial, tanto na repressão a condutas anticompetitivas, quanto no controle de estruturas.

Apesar da autoridade antitruste utilizar das ferramentas tradicionais de análise na definição de poder de mercado na economia digital, em se tratando de mercados multifacetados, leva-se em consideração algumas particularidades, como a interdependência dos grupos de consumidores. A esse respeito, na fusão da Buscapé com a Bondfaro o relator do caso argumentou que, devido a maior dinamicidade dos mercados digitais multifacetados, os casos devem ser analisados considerando as características do próprios mercados e dos player envolvidos em cada contexto particular, com o objetivo de compreender as restrições competitivas e os padrões de substituibilidade, aplicáveis a cada caso concreto. Essa abordagem levou o CADE a dividir o mercado relevante no caso em questão como (i) mercado online nacional de publicidade e (ii) mercado online nacional de busca online de preços e comparação

Outro caso averiguado foi o Ato de Concentração do Itaú Unibanco S.A. com a XP Investimentos S.A.[1], submetido a um Acordo de Controle de Concentração. De acordo com o CADE, a aquisição da XP, um player disruptivo[2], pelo Itaú, poderia significar uma tentativa deste de proteger seu próprio mercado de bancos tradicionais. A competitividade no geral poderia ser reduzida, por meio da aquisição de um player inovador, que estava conquistando cada vez mais clientes. O caso é importante pois demonstra a preocupação da autoridade antitruste brasileira em possibilitar o surgimento de novos mercados a partir de inovação, sem que incumbentes freiem este desenvolvimento.

A publicação deste relatório é o ponto de partida para o desenvolvimento do tema. Ele é de grande significância, pois reflete esforços conjuntos para melhor compreensão dos desafios da economia digital. Além disso, já que a preocupação com a relação entre economia digital e defesa da concorrência é comum às autoridades de defesa da concorrência, o relatório pode gerar insights para os novos desafios que estão por vir.

[1] Ato de Concentração n° 08700.004431/2017-16

[2] Um player disruptivo é aquele que estabelece um novo mercado ou investe em um mercado que não recebia muita atenção dos players incumbentes. Os players disruptivos também costumam transformar não consumidores em consumidores. – “What is Disruptive Inovation” December 2015 issue (pp.44–53) of Harvard Business Review.

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