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O que muda com a Nova Lei de Franquias

O que muda com a Nova Lei de Franquias

Sancionada em 26 de dezembro de 2019, a Nova Lei de Franquias (Lei 13.996/19) deve entrar em vigor no próximo dia 26 de março, exatamente 90 dias após a sua publicação oficial. Na mesma data, as normas atuais (Lei 8.955/94) perderão a vigência.

Este é, sem dúvidas, um marco legal que permitirá mais segurança jurídica e transparência ao sistema de franchising, por incorporar entendimentos jurisprudenciais já pacificados e aperfeiçoar o sistema atual com a inclusão de disposições mais detalhadas. Dentre as principais alterações impostas pela Nova Lei de Franquias, podemos destacar:

Ampliação do rol de itens obrigatórios da Circular de Oferta de Franquia (artigo 2º)

Tal como previa o marco regulatório anterior, foi mantida a regra de que o franqueador deve fornecer a Circular de Oferta de Franquia (COF) ao interessado em tornar-se franqueado, com antecedência de, no mínimo, 10 dias antes da assinatura do contrato ou pré-contrato de franquia ou, ainda, do pagamento de qualquer taxa pelo franqueado. Ocorre que, além de especificar mais adequadamente itens que já eram previstos na Lei 8.955/94, a Nova Lei de Franquias prevê itens adicionais. Ao passo que a lei anterior previa 15 itens obrigatórios, a regulamentação recém aprovada exige 23.

Em relação aos itens adicionais, merecem destaque: (i) a indicação das situações em que são aplicadas penalidades, multas e indenizações; (ii) informações sobre eventuais cotas mínimas de compra pelo franqueado e sobre a possibilidade e as condições para a recusa dos produtos ou serviços exigidos pelo franqueador; (iii) indicação das regras de limitação à concorrência entre o franqueador e os franqueados, e entre os franqueados (ficando mantido o item sobre a eventual exclusividade ou preferência ao franqueado sobre determinado território de atuação e a possibilidade de o franqueado realizar vendas ou prestar serviços fora de seu território); (iv) indicação da existência ou não de regras de transferência ou sucessão; (v) Indicação de existência de conselho ou associação de franqueados e (vi) Situação do franqueado, após a expiração do contrato de franquia, em relação a: (1) know-how, informações confidenciais e segredos de indústria; e (2) implantação de atividade concorrente à da franquia.

Possibilidade de anulação do Contrato de Franquia em caso de omissões ou informações falsas na Circular de Oferta de Franquia (artigo 4º)

A Nova Lei de Franquias trata expressamente das hipóteses de prestação de informações incompletas ou falsas na COF. Agora, seja em decorrência de não disponibilização da COF no prazo indicado no item acima – hipótese que já era prevista na lei anterior –, seja em decorrência de sua disponibilização com omissões ou informações falsas, o franqueado poderá arguir a anulabilidade ou nulidade do contrato de franquia e, ainda, exigir a devolução de todas as quantias já pagas ao franqueador a título de filiação ou royalties.

Essa alteração, somada à ampliação dos itens que devem ser informados na COF, exige cuidado ainda maior do franqueador no tocante à elaboração da COF e à transparência que deve revestir a relação com o franqueado, para que não fique sujeito à rescisão do contrato de franquia e à devolução das quantias que lhe foram pagas, além do dano reputacional que a falta de transparência pode lhe acarretar.

Disposição expressa de que não há relação de consumo entre franqueador e franqueado (artigo 1º)

Diante da ausência de disposição legal expressa, muitos franqueados postularam em juízo a aplicação as regras protetivas do Código de Defesa do Consumidor – como a inversão do ônus da prova, por exemplo –, com a alegação de que eventual subordinação ou a mera desigualdade de porte econômico entre franqueador e franqueado caracterizaria uma relação de consumo. A jurisprudência já havia pacificado o entendimento de que não existe relação de consumo entre franqueador e franqueado e, agora, a Nova Lei de Franquias deixa isso expresso em seu artigo 1º, de forma a eliminar qualquer controvérsia a esse respeito.

Disposição expressa de que não há vínculo empregatício entre franqueador e franqueado e/ou seus empregados (artigo 1º)

Essa disposição também visa encerrar, de uma vez por todas, eventuais discussões sobre a natureza jurídica do relacionamento entre franqueador e franqueado. Ainda que durante o funcionamento do negócio o franqueador preste assistência ao franqueado, e que haja uma área de exclusividade de atuação, é da essência do contrato de franquia que o franqueado (normalmente uma pessoa jurídica) exerça suas atividades de forma autônoma. Essa autonomia pressupõe a inexistência de hierarquia e subordinação entre franqueador e franqueado, afastando qualquer vínculo empregatício. No entanto, esse ponto também já foi objeto de muitas discussões jurídicas, havendo por bem o legislador determinar de forma expressa a inexistência de vínculo empregatício entre as partes.

Possibilidade de sublocação do ponto comercial pelo franqueador ao franqueado e a legitimidade para a propositura da ação renovatória (artigo 3º)

Quem é parte legítima para propor Ação Renovatória de Locação, quando há sublocação de imóvel entre franqueador e franqueado? Essa é uma questão que também já causou bastante controvérsia. Nos termos do artigo 51, parágrafo 1º da Lei nº 8.241/91 (Lei de Locações), o direito à renovação somente pode ser exercido pelo sublocatário. Então, quando há sublocação de imóvel do franqueador para o franqueado, apenas o franqueado (sublocatário) tinha direito de pleitear a renovação do contrato. Contudo, esse dispositivo gerava uma grande insegurança ao franqueador, pela possibilidade de perder o seu ponto comercial, caso o franqueado não exercesse, tempestivamente, o direito à renovatória (artigo 51 parágrafo 5º da Lei de Locações).

Devido à situação peculiar, em especial, o fato de que a renovação do contrato de locação atingiria a esfera jurídica de ambas as partes, a jurisprudência se firmou no sentido de que há litisconsórcio ativo. Ou seja, nessas hipóteses, tanto o franqueador (sublocador) como o franqueado (sublocatário) deveriam figurar no polo ativo da ação renovatória [1]. A Nova Lei de Franquias objetiva encerrar tais controvérsias ao estabelecer que qualquer das partes terá legitimidade para propor a ação renovatória do contrato de locação, quando houver sublocação (do franqueador para o franqueado) do ponto comercial onde se acha instalada a franquia.

A Nova Lei de Franquias estabelece, ainda, em seu artigo 3º, parágrafo único, que o valor do aluguel a ser pago pelo franqueado ao franqueador poderá ser superior ao valor que o franqueador paga ao proprietário do imóvel na locação originária do ponto comercial, desde que: (i) a COF e o Contrato de Franquia assim estipulem expressamente; e (ii) não ocorra onerosidade excessiva.

Validade da eleição do Juízo arbitral pelas partes (artigo 7º parágrafo 1º)

A Nova Lei de Franquias estabelece a validade da eleição do juízo arbitral para solução de controvérsias relacionadas ao Contrato de Franquia. Este tema também sempre foi muito questionado em Juízo, porque muitos franqueados argumentam que seriam hipossuficientes e que a cláusula de arbitragem seria um obstáculo ao seu direito à ampla defesa. No entanto, o próprio Superior Tribunal de Justiça, em vários julgados, já confirmou a validade e a eficácia da cláusula arbitral estabelecida de forma consensual e voluntária dentro da relação tipicamente empresarial, como é o Contrato de Franquia.

A propósito: “A convenção de arbitragem prevista contratualmente afasta a jurisdição estatal, impondo ao árbitro o poder dever de decidir questões decorrentes do contrato, além da própria existência, validade e eficácia da cláusula compromissória. Recurso especial provido.[2]

Nesse contexto, o artigo 7º, parágrafo 1º, da Nova Lei de Franquias, também veio corroborar um entendimento que já vinha se mostrando majoritário nos tribunais superiores.

Regulamentação da franquia pública (artigo 1º, parágrafo 2º)

Outro aprimoramento da Nova Lei de Franquias é a possibilidade de que o sistema de franquia seja adotado por entes estatais ou empresas de economia mista, no intuito de expandir suas operações, independentemente do segmento em que desenvolvam as suas atividades. A lei anterior não previa essa possibilidade, o que também gerava discussões a respeito do tema. O artigo que especificava as regras de licitações para as franquias públicas foi vetado pelo Presidente da República, com o entendimento de que o procedimento licitatório geraria insegurança jurídica por conflitar com a Lei das Estatais.

[1] Vide TJSP, Agravo de Instrumento nº 2170324-04.2014.8.26.0000, Rel. Adilson de Araújo, julgado em 25 de novembro de 2014.
[2] STJ, Recurso Especial nº 1.597.658- SP, 2013/0098107-2, julgado em 18 de maio de 2017, Rel. Min. Nancy Andrighi. No mesmo sentido: STJ, Conflito de competência nº 146.939 – PA (2015/0145422 02), Rel. Min. Marco Aurélio Belizze, julgado em 23.11.2016.1587

O L.O. Baptista coloca-se à disposição para prestar mais esclarecimentos a respeito da Nova Lei de Franquias.

Contatos:

Esther Jerussalmy Cunha[email protected]

Reynaldo Guimarães Vallú Neto[email protected]

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