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Superendividamento e repactuação de dívidas de pessoa física

Superendividamento e repactuação de dívidas de pessoa física

Recentes alterações legislativas reforçaram a importância da negociação e do uso de métodos adequados de soluções de conflitos para aprimoramento da recuperação do crédito e utilização ordenada e racional da via judicial.

Hoje é consenso que boa parte da população brasileira, notadamente aquela de baixa renda, encontra-se excessivamente endividada. Assim, a cobrança das dívidas ocorre de maneira desordenada e sem qualquer racionalidade.

Embora a lei brasileira tenha, no passado, previsto a figura da insolvência civil, o atual Código de Processo Civil não dedicou um artigo ou capítulo sobre isso.

Apesar disso, e atento ao fenômeno do superendividamento das famílias brasileiras, o legislador houve por bem introduzir algumas modificações na legislação em vigor, por meio da Lei nº 14.181/21, que alterou o Código de Defesa do Consumidor e o Estatuto do Idoso.

Com base nessas alterações, uma pessoa física pode procurar o Poder Judiciário para equacionar todas as pendências envolvendo diferentes credores, propondo, com a participação de todos, um plano de pagamento.

Com a finalidade de orientar a população em geral e também os operadores do direito, o Conselho Nacional de Justiça editou a Cartilha sobre o Tratamento Superendividamento do Consumidor. O seu conteúdo aponta dez princípios paradigmas seguidos pela lei, entre os quais vale mencionar.

  1. Educação financeira e ambiental dos consumidores: o inciso IX do art. 4°, da Lei n. 14.181/2021, menciona a necessidade de “fomento de ações direcionadas à educação financeira e ambiental dos consumidores”.
  2. Combate à exclusão social: o superendividamento ocasiona não só a exclusão econômica do indivíduo, mas também a sua exclusão social, impedindo-o de interagir e atuar na sociedade. Assim, tratar do superendividado não significa reinseri-lo na vida econômica do país, mas também reintegrá-lo na coletividade.
  3. Prevenção do superendividamento: o endividamento excessivo é hoje um mal que grassa a sociedade. A fim de combate-lo, não só o Estado, mas todos devem dar sua contribuição mediante prática saudáveis. Assim, a lei reforça o dever de informação e na publicidade (artigo 52 do Código de Defesa do Consumidor) e medidas para evitar abusos e fraudes na concessão de crédito artigos 37 e 39 do CDC, introduzindo a noção de “crédito responsável” (art. 54-A a 54-G), possibilitando o tratamento (extrajudicial e judicial) do superendividamento, de modo a proteger, de modo especial, o consumidor pessoa natural.
  4. Preservação do mínimo existencial: a fim de dar concretude à garantia de propiciar a dignidade da pessoa humana, foi editado o Decreto n. 11.150, de 26 de julho de 2022, que dispõe: “no âmbito da prevenção, do tratamento e da conciliação administrativa ou judicial das situações de superendividamento, considera-se mínimo existencial a renda mensal do consumidor pessoa natural equivalente a vinte e cinco por cento do salário-mínimo vigente na data de publicação deste Decreto” (cf. art. 3º)
  5. Repactuação da dívida – por meio de planos de pagamento e cooperação global/consensual: umas das formas de evitar ou equacionar o superendividamento é a repactuação das dívidas, seja por intermédio de métodos consensuais de solução de controvérsias, seja com a intervenção do Poder Judiciário,
  6. Consequências (sanções) da violação do dever de boa-fé (da quebra positiva do contrato): como ressalta a cartilha, “a Lei n. 14.181/2021 regulou os deveres de boa-fé na concessão de crédito do fornecedor direto do consumo (art. 3º do CDC), do fornecedor de crédito (art. 52 do CDC) e de seus intermediários (arts. 54-B e 54-D), do ofertante de crédito e na venda a prazo (art. 54-B, Art. 54-D) e na cobrança de dívida (art. 54-G)”, impondo sanções no caso de não observação desses preceitos.

Em conclusão, a aplicação dessas medidas previstas em lei tem a intenção de não só ajudar a reinserção econômica e social dos excluídos, mas também contribuir para melhorar o ambiente de negócio no Brasil.

Autoria de: Marco Lorencini

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