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Crise política deixa o investidor atento ao rumo das concessões

Crise política deixa o investidor atento ao rumo das concessões

DCI – Diário Comércio Indústria & Serviços
28/04/2016

Sinal amarelo. Em meio a um cenário de dicotomia, analistas e empresários mostram que a perda do grau de investimento fica em segundo plano diante da instabilidade no governo atual

São Paulo – Os potenciais investidores estrangeiros em concessões de infraestrutura olham com atenção a política nacional, e mostram que a perda do grau de investimento no País interfere menos nos planos que a instabilidade institucional. Agora, tal como o resto do Brasil, o mercado se divide entre os que apostam na mudança de presidente e os que acham que é preciso deixar o País estável.

“Os potenciais investidores estão analisando calmamente o movimento político no Brasil”, afirmou o advogado Dimitri Hetchkovich, que faz parte de uma comitiva brasileira que orienta a russa RZHD Internacional, sobre como participar de concessões ferroviárias.

Segundo o advogado, o diretor-geral da empresa, Sergey A. Pavlov, mantém o interesse dos investimentos no Brasil, mas talvez seja necessário rever alguns parâmetros atuais. “Acredito que se houver uma mudança no comando do País, o novo governo precisará dialogar mais com o empresário para garantir que os contratos sejam honrados, e isso pode envolver questões como aumento da Taxa Interna de Retorno e revisão das outorgas”, revelou ele ao DCI.

A possibilidade de facilitar a chegada de investidores estrangeiros é uma preocupação para o doutor em relações internacionais pela Universidade de São Paulo (USP), Nelson Requião. “O PMDB tem um formato de negociação mais parecido com o aplicado pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, e o Temer é um bom articulador com o empresariado. A minha dúvida é se novos formatos para concessão teriam o mesmo impacto aos cofres públicos e retorno social”, disse ele, lembrando que o atual modelo tem Taxa Interna de Retorno (TIR) estimada em 8,5%, além de pagamento de outorga e obrigações de aporte.

Leilão a toque de caixa

Na contrapartida, o advogado Camilo Horta, que acompanhou uma comitiva de chineses que vieram ano passado analisar portos brasileiros, afirma que uma mudança no governo possa melhorar o ambiente de negócios. “Uma alternância poderia trazer soluções mais eficazes para economia. Além disso, os chineses se mostraram um pouco confusos com as leis brasileiras e, talvez, um novo governo traga condições mais regulares nas concessões”, disse ele.

Para o advogado, o atual governo se mostrou “caótico e desconexo”, com leilões que mais confundiam do que facilitavam. “O Brasil poderia contar com muito mais capital chinês, se não tivéssemos uma burocracia desanimadora para participação no certame”, diz.

Para um empresário do ramo portuário, que falou ao DCI sob condição de anonimato, há uma divisão no setor. “O futuro é incerto, mas o caminho tem de ser o do crescimento, independente do presidente”, disse. O empresário ressalta que os planos atuais do governo para investimento em infraestrutura, que envolve R$ 198,4 bilhões em concessões de rodovias, ferrovias, portos e aeroportos, sendo R$ 69,2 bilhões entre 2015 e 2018 e R$ 129,2 bilhões a partir de 2019 é muito positivo. “Gostamos do Plano de Investimento em Logística, mas ficamos frustrados com o ritmo lento de liberação dos editais. Mas não há garantias que outro presidente conseguiria mudar isso.”

A postura cautelosa é compartilhada pelo advogado especialista em infraestrutura e sócio do L.O. Baptista-SVMFA, Fernando Marcondes. O especialista ressalta que Temer, além de precisar lidar com um cenário de instabilidade política, teria de enviar sinais ao mercado para restabelecer a confiança do setor privado. “O segmento de infraestrutura está paralisado, os sinais têm sido negativos há muito tempo e isso desestimulou a iniciativa privada”, diz Marcondes, afirmando que a apresentação de um programa de governo com metas bem definidas seria um primeiro passo para estimular a iniciativa privada e promover a retomada de obras de infraestrutura. “Mas, para um reaquecimento definitivo, ainda precisamos de dois a três anos de recuperação da economia como um todo.”

Este ano, o governo previa licitar áreas nos portos de Outeiro, Santarém e Vila do Conde no Pará, além de espaços no Porto de Santos, em São Paulo, movimento que deve ser postergado com a crise institucional.

Menos intervenção

Para o presidente da Associação Brasileira dos Terminais Portuários (ABTP), Wilen Manteli, a questão do intervencionismo governamental nas concessões é um problema. “Independentemente de como fica a situação política, temos que reduzir o intervencionismo estatal na atividade. Isso fragiliza contratos e atrapalha o desenvolvimento.” Por outro lado, o coordenador do núcleo de logística da Universidade Federal de Maringá, Fernando Couto Filho, aponta que o problema atual não é a intervenção do governo nas concessões, mas a dificuldade de liberar os editais no Tribunal de Contas da União. “O TCU trava os editais porque eles saem das agências reguladoras com problemas.”

Na visão do especialista, mesmo que a presidente Dilma deixe o cargo, o período de boa vontade com Temer não deverá se estender. “Todos querem respostas rápidas, e o atual cenário não possui retorno imediato.”

Risco Brasil

Para o consultor de riscos políticos e investimentos no exterior da Aon Brasil, Keith Martin, o Brasil mantém um risco médio para atrair investimento estrangeiros, principalmente em concessões de infraestrutura, que envolvem um período grande de contrato. “A atual situação tem aumentado os riscos em curto prazo, em particular os riscos não políticos, porém, o país possui instituições robustas e grandes reservas de divisas, o que pode a médio prazo levar a uma certa recuperação”.

Segundo o analista, o risco para investidores não envolve só problemas no governo. “Os escândalos de corrupção feriram não só a imagem do governo, mas também afetaram a competitividade das empresas, principalmente no setor de construção e infraestrutura”.

Ele ressalta, no entanto, que esse cenário abre oportunidades para as empresas estrangeiras, já que permite processos mais abertos e grandes possibilidades de fusões e aquisições.

O advogado russo Hetchkovich , questionado sobre a influência da queda no grau de investimento no País – promovido pela Moody’s, Standard and Poor’s e Fitch – cita que o problema é pontual. “Os russos também ganharam um selo de mal pagador, mas o investimento em infraestrutura é pensando no longo prazo”, disse.

Paula Cristina

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