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STJ suspende cobrança judicial até decisão final em arbitragem

STJ suspende cobrança judicial até decisão final em arbitragem

Valor Econômico – Legislação&Tributos
02.03.2017

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu recentemente duas questões importantes sobre o uso da arbitragem no país. Uma delas é que a execução judicial de contrato com cláusula arbitral só pode ocorrer após decisão final dos árbitros. Outro ponto é que recursos de terceiros (embargos) também devem ser avaliados pela via arbitral.

No caso analisado, o ministro Marco Aurélio Bellizze, da 2ª Seção, concedeu liminar para suspender uma cobrança que tramita na Justiça contra cinco incorporadoras imobiliárias. Sem a liminar, R$ 5 milhões poderiam ser levantados antes de o mérito da questão ser definido pela arbitragem.

O caso envolve a Leal Moreira Engenharia, que atua no Pará. A companhia entrou com ação de execução de título extrajudicial contra a Torre de Ferrara Incorporadora, a Torre de Rhodes Incorporadora, a Esperança Incorporadora, a Orion Incorporadora e a Gundel Incorporadora para cobrar supostas dívidas de um contrato de construção.

A empresa de engenharia pediu o arresto de cerca de R$ 26 milhões das contas das executadas. Ainda solicitou o levantamento de R$ 5 milhões que estavam depositados em juízo como caução, o que havia sido concedido pela juíza da 1ª Vara Cível e Empresarial de Belém, Rosana Lúcia de Canelas Bastos.

Apesar de ter sido levado ao Judiciário, o contrato entre as companhias possui cláusula arbitral e determina que qualquer conflito deve ser julgado pelo Centro de Arbitragem e Mediação da Câmara de Comércio Brasil Canadá. O processo arbitral já foi iniciado, com a intimação das partes.

Diante disso, as empresas que constam como terceiras no contrato, Agra Empreendimentos Imobiliários e Agra Maligawa Incorporadora, e as demais incorporadoras que sofrem a execução, levaram o caso diretamente para o STJ para tentar suspender a execução. Entraram com o chamado conflito de competência para que a Corte pudesse definir quem deveria decidir a disputa: a Justiça ou o juízo arbitral.

Segundo a decisão do ministro Marco Aurélio Bellizze, a 2ª Seção é competente para definir o tema e cita precedentes nesse sentido. No caso concreto, Belizze destaca que “o procedimento arbitral foi instaurado para dirimir temas contidos em embargos à execução e de terceiro, cuja competência não é atribuída ao juízo estatal que, embora possa processar a execução, deve aguardar a definição pelos árbitros – opção escolhida livremente pelo contratantes ao estipularem a cláusula compromissória arbitral – das questões de mérito dos embargos, das atinentes ao título ou às obrigações ali consignadas (existência, constituição ou extinção do crédito) e das matérias que foram eleitas para serem solucionadas pela instância arbitral”.

Ainda ressalta o ministro que a decisão que será proferida pelos árbitros diz respeito exatamente ao débito que é perseguido na execução. “Assim, ao menos em princípio, o resultado do procedimento arbitral produzirá efeitos diretos sobre o prosseguimento da ação de execução.”

Os advogados das empresas que foram ao STJ, Natália Diniz e Paulo Dóron Rehder de Araujo, afirmam que a decisão é a primeira que se tem notícia na qual o STJ suspende uma execução em razão de terceiros terem entrado com o pedido de arbitragem. “A decisão, para o mundo da arbitragem, é uma tremenda boa notícia, já que se trata do STJ, órgão máximo para tratar do assunto”, diz Araujo.

No caso, segundo o advogado, ficou demonstrado que as empresas terceiras, que também participam do mesmo contrato, têm interesse na discussão que foi para a via judicial e que deve ser resolvida via arbitral. Natália ressalta que a urgência da medida fez com que levassem a discussão ao STJ, já que R$ 5 milhões poderiam já ser levantados pela empresa de engenharia sem que o mérito fosse definido pela arbitragem, o que poderia trazer sérios riscos.

Paulo Macedo, sócio da área de arbitragem do L.O. Baptista Advogados, afirma que essa decisão fortalece o uso da arbitragem. “Os investidores estrangeiros sempre perguntam se a cláusula arbitral, utilizada no mundo todo, será respeitada pelo Judiciário brasileiro. E mais uma vez o STJ deu mais segurança para o nosso sistema”, diz. Ele afirma que essa é a primeira vez que a Corte suspende uma execução por liminar, em um conflito de competência, o que traz mais segurança para que a arbitragem decida sobre o tema. O que o STJ já tinha analisado antes era uma cautelar de arrolamento de bens.

Especialista em arbitragem, a advogada Selma Lemes diz que a forma como o STJ tem tratado o conflito de competência que envolve a arbitragem é equivocada. “A arbitragem é jurisdição privada e, portanto, não se há falar em conflito de jurisdição. Ele não existe. Havendo dúvida sobre a competência do tribunal arbitral, quem tem que resolver é o próprio juízo arbitral”, afirma.

Para ela, a decisão complementa e aprimora entendimentos anteriores ao reafirmar que na ação de execução o julgamento do mérito não se dará por meio de embargos no Judiciário, mas por arbitragem. ” O que chamou minha atenção foi o fato de a juíza de primeiro grau extrapolar sua competência ao liberar a caução. Essa questão deve ser apreciada no tribunal arbitral”, diz.

O advogado da Leal Moreira Engenharia não foi localizado pelo Valor para comentar a decisão.

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