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A empresa pode exigir o passaporte vacinal a seus empregados?

A empresa pode exigir o passaporte vacinal a seus empregados?

20/12/2021

A partir de consultas que temos recebido de clientes de diferentes segmentos, identificamos um movimento semelhante que é resultado da combinação inusitada de virada de ano e melhora nos números da pandemia: a intenção de retomar, já no início de 2022, as atividades presenciais de forma mais robusta e constante, ainda que em um sistema híbrido.

Mas, o momento ainda é crítico e não podemos nos descuidar. Para retomar o trabalho presencial é preciso ter em mente a implementação de algumas medidas que possam reduzir os riscos que o retorno aos escritórios pode oferecer.

Além das providências mais comuns, como uso de máscaras e álcool gel, uma medida a ser considerada é a exigência do chamado passaporte vacinal. A dúvida que surge, no entanto, é: o empregador pode exigir o comprovante de vacinação dos seus empregados, prestadores de serviços, fornecedores etc.? E outra pergunta ainda mais difícil: o que fazer com o empregado que não comprova ter sido vacinado? 

Trata-se de uma discussão complexa, com diversos argumentos para qualquer dos lados que se pretenda defender, e que conflita diretamente dois princípios constitucionais: o direito fundamental à saúde x o direito à liberdade.

Não pretendemos aqui resolver esse dilema entre dois Direitos Fundamentais já que teríamos de recorrer a diversos métodos/técnicas de hermenêuticas, técnica de ponderação, os prós, os contras, os argumentos jurídicos, científicos e sociais na busca de uma possível solução.

No entanto, queremos trazer algumas informações de ordem prática para auxiliá-lo(a) na tomada de decisões.

Apenas como exemplo, ao menos 38 Tribunais do país, incluindo o STF, já adotaram ou informaram que irão aderir ao passaporte vacinal.

Diversos órgãos públicos, em variados Estados, estão cobrando a comprovação da vacinação para as pessoas adentrarem nos edifícios.

E, além disso, recentemente o ministro Barroso (do STF), em decisão liminar que será submetida aos demais ministros, impôs o passaporte da vacina para todo viajante do exterior que desembarcar no Brasil. Diante deste cenário, como tratar o assunto?

O STF já se posicionou no sentido de que a vacinação é compulsória e pode ser exigida na medida em que se trata de um direito coletivo, que se sobrepõe ao interesse individual. Privilegia-se a saúde da coletividade em detrimento da liberdade individual.

No entanto, na mesma decisão o STF assentou o entendimento de que, apesar de compulsória, o Estado não pode vacinar o cidadão à força, mas pode se valer de medidas restritivas, como acesso a locais de grande circulação, por exemplo.

A questão é que a empresa não é o Estado e até que ponto uma entidade de direito privado poderia impor restrições?

Uma empresa nos procurou recentemente dizendo que alguns empregados cuja atividade principal é visitar clientes não estão sendo autorizados a ingressar nas dependências de alguns clientes porque não se vacinaram. Como resolver esse impasse? O que fazer com esses empregados?

A despeito da existência de várias leis que foram aprovadas nos últimos dois anos para lidar com as diversas questões associadas à pandemia, nenhuma delas nos fornece respostas para essas perguntas. Assim, cabe-nos recorrer ao Judiciário.

Como o assunto ainda é novo, os Tribunais não tiveram tempo ainda para pacificar um entendimento, mas observamos uma corrente se fortalecendo no sentido de reconhecer que a exigência da vacinação dos empregados está inserida dentro do poder diretivo do empregador a ponto de autorizá-lo a exigir o comprovante da imunização, sob o argumento de que o interesse coletivo se sobrepõe o individual.

Além disso, cabe ao empregador a responsabilidade de garantir um ambiente de trabalho seguro e hígido. Se o empregador pode ser responsabilizado na hipótese de contaminação dentro do seu estabelecimento, ele tem que ter ferramentas disponíveis para evitar que isso aconteça – daí a importância de se adotar outras medidas preventivas, não apenas a exigência do uso de máscaras e álcool gel, mas também campanhas de conscientização de forma geral.

Nessa linha, uma vez que a empresa adota medidas de proteção, implementa campanhas de conscientização, estimula a vacinação, mas ainda assim possui empregados que se recusam a tomar a vacina sem qualquer justificativa plausível, entendemos que esta – como último recurso – pode, sim, se valer de uma dispensa por justa causa.

E mais. Entendemos que eventual recusa, se baseada apenas por convicção, ideologia ou crença religiosa (esse é um aspecto bem sensível), não seria suficiente para evitar a aplicação de sanções. Justificativa plausível, ao nosso modo de ver, seria apenas aquela baseada em critérios médico-científicos e fundamentada em um laudo ou um relatório.

E o fundamento legal para esse entendimento nós extraímos do art. 158 da CLT:

Art . 158 – Cabe aos empregados:
I. observar as normas de segurança e medicina do trabalho, inclusive as instruções de que trata o item II do artigo anterior;
II. colaborar com a empresa na aplicação dos dispositivos deste Capítulo.
Parágrafo único – Constitui ato faltoso do empregado a recusa injustificada:
a) à observância das instruções expedidas pelo empregador na forma do item II do artigo anterior;
b) ao uso dos equipamentos de proteção individual fornecidos pela empresa.(g.n.)

Na linha do que estabelece o art. 158 da CLT, o empregado é obrigado a se submeter a todas as regras e utilizar os equipamentos de proteção – aqui incluídos máscara e álcool gel – que devem ser fornecidos pelo empregador. O mesmo raciocínio se aplica à vacinação.

Cada caso possui suas peculiaridades e deve ser visto com cuidado e de forma individualiza. Contudo, em teoria e genericamente falando, não cumpridas as medidas de segurança impostas pela empresa, o empregado pode sofrer sanções, o que inclui a dispensa por justa causa.

Reiteramos que, apesar de haver algumas decisões judiciais reconhecendo dispensas por justa causa de empregados que não se vacinaram, esse entendimento está longe de ser homogêneo no meio jurídico e o Judiciário ainda será chamado a se posicionar de forma definitiva.

Nossa equipe Trabalhista está à disposição para esclarecer os aspectos e as dúvidas referentes a este e outros assuntos.

Autoria de: Fabio Chong de Lima

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